sábado, 29 de dezembro de 2007

A letra

Está frio, tão frio que a minha letra treme
Trémula se compõe nas folhas
Um berço onde se deita
Para mais tarde falar.

Um copo de luz para aquecer
Recebe-a bem
O calor virá sempre de dentro
Quando o corpo trabalha

E a pele rubra vai aquecendo
Com a letra em plena orgia
De temperaturas e vislumbramentos
É uma segunda ideia

Surgem caminhos por desbravar
Surgem caminhos já embriagados
Os olhos mais vêem o andar do autor
Que a letra dele escorrida

Os tufos de humidade tapam a lua
Antevê-se que vem cheia
Mas o tempo passa e os uivos não se ouvem
O lobo não nasceu ou a história não tem sentido

Está frio e tudo treme
Bem se nota no emaranhado de letras
Donde nada se tira de perceptível
Embrulharam-se para fugir

Foge-se do lobo e do frio
Mas uma volta de um ó tremido
Denuncia um medo
Que não foge de raiva nem procura agasalho

Descai a mão ampara-a
És suficiente para cair para isso perceber
O teu calor não é de aquecer
Cai e verás o que ouves

Milhões de uivos miscelâneas de outroras
A palavra cedeu simples e não há
A minha letra no berço fica,
Mais tarde falará.

in "Profundo Azul"

2 comentários:

António Sérgio Godinho disse...

Em todo o frio há um calor guardado.

Anónimo disse...

com a tua letra escorrida, continua a trabalhar na tua escrita...